Balanço emocional

Um mês passado, está na altura de fazer um balanço. 

Não custou a partida no aeroporto, até porque depois de duas semanas com jantares quase todos os dias e depois do Natal, ainda tive uma passagem de ano tresloucada, aleatória e que apenas me permitiu dormir uma hora antes do voo. Não custou mudar de casa. Não custou mudar de cama porque eu sou uma lontra que durmo em qualquer canto. Não custou passar a ter de partilhar uma cama grande embora dê murros e seja um desastre com cobertores. Não custou ver sempre a mesma pessoa e tê-la sempre presente porque na minha casa  (anterior) os momentos sozinhos e silenciosos são uma coisa muito rara. Não custou ter de lavar a roupa, arrumar e limpar a casa, fazer o jantar e a cama todos os dias porque além de ser muito mimada há uma real divisão de tarefas, tornando tudo fácil. Não custou passar o tempo porque até passou bem rápido para mim. Não custou o frio porque eu sou uma pessoa de invernos. Nem sequer custaram todas as viagens sobrecarregadas ao supermercado, sempre são viagens.

Custou-me a falta da bolacha americana com ovos moles e Nutella, a primeira coisa que irei comer quando me apanhar em Espinho. Fez alguma falta o cheiro do mar porque as montanhas não têm cheiro. Fez falta o peixe e a fruta. Uma internet manhosa em casa foi realmente desesperante, finalmente amanhã vêm instalar internet. Fizeram-me bastante falta algumas das minhas saias que optei por deixar por não ter mais espaço. As máquinas fotográficas que deixei em Portugal também me deixaram alguma mágoa. As batatas fritas em palha, as pipocas doces e as formas para bolachas também deviam ter vindo. E os cafés cheios de pessoas conhecidas e amigos também deviam ter sido enfiados na mala e plantados no descampado aqui em frente a casa. 

Falando de coisas mais sérias, aquilo que vocês estão ruidinhos por saber, de modo a concluírem se o que previam batia certo. É verdade, têm toda a razão e aconteceu exatamente como eu própria previ: o que realmente custou e custa todos os dias mais um bocadinho foi a alteração drástica do meu ritmo de vida. Custou acordar todos os dias e não ter horários. Sinto muita falta do contra-relógio, da necessidade de dias com 48h. Sinto falta de organizar jantares, das sextas e dos sábados à noite que vivia entre a gestão do "estou tão exausta" com o "sexta não é sexta passada em casa". E tudo isto, quando é sentido de forma brusca e sem desculpas faz com que chegue a tocar no dramatismo, tem dureza envolvida e é preciso bastante foco para que não traga infelicidade.

Explicando de uma forma mais concreta e prática, tenho um lado neurótico. É uma espécie de guerra interior entre o meu consciente e o meu sub-consciente. Quando há alguma coisa que o meu consciente descobre não estar bem, o inconsciente fica a martirizar-se e é realmente difícil de gerir. Há quatro anos e meio atrás estava numa fase em que o meu lado neurótico me possuía grande parte do tempo. Nessa altura, decidi que não podia ser dessa forma e teria de tomar as rédeas da coisa. Assim o fiz. Pus em marcha vários projetos e experiências que queria ter. Tinha o horário definido ao minuto. Foi um ano tresloucado e muito divertido, em que era capaz de estar um mês a dormir um máximo de seis horas por noite. Foi um ótimo ano e uma excelente recuperação.

Aqui e agora tenho um foco muito grande: encontrar trabalho na minha área. Esse foco e a possibilidade de acontecer brevemente fazem com que tudo encaixe, ganham forma e objetivo. Mas não ocupam o tempo e a elevada probabilidade de não acontecer e de ter de investir muito mais no alemão para procurar outros caminhos, aumentando o tempo em que vivo sem um horário para o que acontecerá imediatamente após acordar moem-me e despertam o meu lado neurótico. Não é uma questão de não ter nada para fazer, mas de não ter responsabilidades que impliquem outras pessoas.

Resumindo, emocionalmente não tem sido fácil levar uma vida de dondoca, onde posso arranjar as unhas às 11 da manhã. Mas emocionalmente ainda (pelo menos no final do primeiro mês) me sinto equilibrada, com um apoio incondicional. Não sinto falta das pessoas porque continuo a manter tanto contacto quanto necessito, Sinto falta de algumas coisas superficiais, mas tenho a certeza que não interferem na estabilidade. Ao final de um mês a balança ainda está muito equilibrada e só faltam 11 dias para comer uma bolacha americana com Nutella e ovos moles.


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