Cenas metálicas

São 11h45, tenho mil quinhentas e cinquenta e cinco coisas por fazer, tenho os dentes adornados de prateado e cor de laranja e não sei se ria se chore.

Ora, então, eu, Sara, ex-fã da cadeira do dentista declaro que a experiência de usar cenas metálicas nos dentes e ter contacto com todo um vasto leque de materiais para fazer variadas cenas nas cenas metálicas não abona, nem um bocadinho, a favor dos dentistas.

Vou então contar-vos a história desde o princípio. Tudo começou há 6 anos, quando eu ia ao dentista, no máximo, de dois em dois anos e vivia alegremente sem nunca ter tido uma única cárie. Nessa altura comecei a sentir umas dores manhosas ao abrir a boca e as minhas habilidades ginástico-malabarísticas  começavam a aumentar os ruídos. Procurei um especialista, conheci a fofinha Dra. Cláudia que me informou que a minha boca, como todas as restantes articulações do meu corpo, apresenta uma flexibilidade além do normal e que teríamos de tentar reduzi-la.

Muito animador, portanto. Eu que me divertia e impressionava, entrando em campeonatos com os meus primos, igualmente flexíveis, perdia ali uma das minha maiores vantagens.

Adiante, um aparelho manhoso de cenas metálicas não era solução, uma boquilha à pugilista era só solução temporária... teria de ir à faca, cortar ossos e ficar muitos dias sem abrir a boca. Tendo em conta a agressividade da solução definitiva e o absurdo de dinheiro que ela custava, preferi passar a dormir como se estivesse pronta para saltar para dentro de um ringue de boxe, de boquilha em riste.

As minhas visitas ao dentistas passaram a ser mensais. A boquilha (goteira) foi funcionando, reduzindo as dores durante uns dois anos. Depois voltaram a aparecer, da mesma forma que desapareceram, lentamente e enfatizando o problema sempre que o stress aumentava. Há um ano o stress veio para ficar 24 horas por dia e as dores passavam da boca para o pescoço e depois para a cabeça. Estar sob stress e ainda ter dores que não me deixam esquecê-las não é bom, é péssimo.

Foi aí que tomei a decisão que me faz ter um odeiozinho por idas ao dentista, cada vez mais profundo e mesquinho. Primeiro foram os sisos, um de cada vez para aumentarem o sofrimento. O último foi a cereja no topo do bolo e teve direito a 7 pontos e uma semana sem qualquer comida quente. Depois, subtilmente, veio o encantador aparelho metálico. Primeiro só em baixo, numa de se fazer de sonso e tentando que eu achasse que ele não estava. Mas de sonso ele não tinha nada e foram mais uns quantos dias a comer papas. Depois em cima, com direito a avarias do sistema de aspiração e saídas à rua só com parte do aparelho. 

Entretanto surgia o gangue do otimisto: 'Ah, normalmente as pessoas ficam mal de aparelho, mas tu", "Que gira que estás!"... e outras tantas balelas - deve ser um gangue tipo o das amigas das grávidas que lhes fazem questão de dizer que elas enquanto fabricadoras de seres humanos são ainda mais bonitas do que no seu estado normal, magro e cuidado. 

Hoje atingimos um auge: arranquei cenas metálicas para pôr cenas metálicas maiores. Foram 2h15 sentada na puta da cadeira do dentista. Ora arranca bráquete, ora raspa dente porque há restos de cola, ora quase me tiram o dente fora e eu os processo por agressão e negligência. Felizmente esta última parte não aconteceu, mas isso não invalida o drama que aquilo foi. Ora escacha a boca para um lado, ora para o outro, ora chega para cá o alicate do pré-molar e toma o alicate de cortar arame, chega para cá mais um bráquete, ácido e cola. Aaaaaahhhhhh!

Uma verdadeira obra de engenharia, portanto... mas a engenharia já pensava em soluções tão eficazes e menos agressivas! Isso das cenas metálicas devia ser reinventado e devia incluir um processo de lavagem automático. Não sei se estão a ver o filme que é lavar os dentes com isto na boca, pior ainda quando se tem um dentista limpezo-obcecado. Ele quer que eu lave os dentes 8x por dia. Na realidade são só 4, mas duas dessas lavagens implica escovar os dentes 3 vezes, usar escovilhão e fio dental. Para as lavagens grandes preciso de no mínimo dos mínimos 30 minutos... o que perfaz 2 horas do meu dia a lavar os dentes. Não falando da ideia fantástica de usar fio dental enfiando-o de bráquete em bráquete.

Estou portanto muito feliz com isto, entrei às 9h30 no dentista e a manhã foi-se. Vou até ali comer qualquer coisa e pensar em que casa de banho pública vou lavar os dentes. Bom, ah?

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