Via Sacra

É sexta feira santa. Eu, que estou habituada a que este seja o dia da Via Sacra encenada, que seja um dia para uma certa reflexão e ainda que esteja circunstancialmente afastada de todo este caminho pascal, sinto a necessidade de parar um bocadinho.

Falemos do jejum da quaresma. Não, não é o jejum da carne. O jejum espiritual que nos faz descer alguns degraus e tornarmo-nos mais humildes, como um detox de tudo o que nos traz o sentido de superioridade e de poder sobre os outros. É um dos problemas da atualidade e sente-se cada vez mais nas redes sociais.

Todos temos uma opinião sobre tudo o que mexa e aconteça, todos somos senhores da razão e comentamos arrogantemente a opinião dos outros. Já chega! Já chega de condenações, já chega de não nos informarmos devidamente e de não pensarmos que do outro lado do ecrã haverá uma pessoa - não um computador. Falta-nos jejuar das redes sociais, da adrenalina dos likes, da frieza dos comentários. Falta-nos viver mais a vida para lá do computador, desligar e carregarmos a cruz de cada um sem mais nada e prestar atenção ao quão bonito é o mundo.

Falemos de quedas. Acho-me numa boa posição para falar de quedas (ou talvez não). Ando a recuperar de uma. Vim para cá por opção e ciente da quebra, mas convencida de que num mês haveria trabalho. Não aconteceu num, nem em dois meses. Não foi uma queda grande, não houve ninguém muito doente, não foi um mal que se eternizará. Mas isso é porque com os males dos outros podemos todos bem. Para mim, foi uma queda, pequenina é certo, mas foi e custou. Só havia duas saídas: levantar, seria uma delas; a outra era não sair da cama, não ter ideias e engordar com pipocas e filmes. Isso não aconteceu e não há-de acontecer, da mesma forma que se fosse algo mais grave.

As quedas não são difíceis se aceitarmos ajuda, se aceitarmos o que de bom nos trazem e mostram as pessoas à nossa volta. Chamem-me hippie, às vezes até o sou - penso muito no quão somos moldados pela sociedade e tudo. Chamem-me demasiado feliz, que eu esforço-me por nunca o deixar de ser. Mas é sempre mais fácil assim, ser transparente e acreditar que haverá sempre alguém para dar uma mãozinha.

Talvez mais importante seja pensamos que depois da humildade, depois de aceitarmos a ajuda e de termos feito o jejum, poderemos cair outra vez, poderemos ser condenados uma vez mais. Mas o caminho será sempre o mesmo, será sempre cíclico. Da mesma forma que recordamos a crucificação e a libertação de Jesus todos os anos, nós mesmos poderemos ser "libertados" depois de uma "onda de má sorte", desde que não deixemos de acreditar em sorte.

No fundo, tudo isto é uma questão de fé. A Via Sacra de Jesus é um facto histórico... já acerca da libertação só acredita quem a tem.
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