Voluntariado


Conheço uma menina de cabelos escuros, castanhos, pelos ombros. É uma menina que passa vida a sorrir. Uma menina que tem 21 namorados virtuais e que se sente envergonhada se puxarmos o assunto. Canta bem que se farta e tem um riso muito característico e fofinho. Quer ser cantora! Tem duas irmãs mais velhas e um mais novo. A D. faz meia-hora a pé para a escola porque a mãe não lhe carrega o passe de transporte, e gosta do tempo que lá passa. Não tem muitos amigos mas adora os que tem. Gosta de comentar os rapazes giros que passam e não se importa com as coisas más que a rodeiam. Na verdade, eu acho que não tem bem a noção delas. Tem um mundo só dela e uma necessidade enorme de contar tudo o que lhe acontece. Ora que o pai tem uma amiga com a qual fala horas ao telefone, situação que a mãe reprova, ameaçando sair de casa. Ou então da irmã, também conta da irmã que tem 20 anos e está no 6º ano de escolaridade. A D. é muito inteligente mas penso que nunca estudou em casa. Não estuda em casa porque ninguém a deixa sossegada e ninguém se importa com isso.
A primeira vez que me falaram da D. foi há uns meses. Disseram-me que era uma menina bastante complicada e sem capacidades para transitar de ano. Até disseram que podia ser difícil lidar com ela. Difícil? Difícil é aceitar que os professores não são capazes de chegar aos miúdos e são incapazes de atingir que no dia de anos dela só precisava que lhe cantassem os parabéns, dado em casa o mais provável ser não o fazerem. 
Sabíamos que ela fazia anos, ia passar a ser teenager e queríamos fazê-la um bocadinho mais feliz. Como todas as quintas, a D. foi a primeira a chegar e mal entramos tratou de relatar tudo. O que recebeu, o que deixou de receber, o que fez e o que deixou de fazer. Mostrou-nos os pompons que aprendeu a fazer e apresentou-nos a sua boneca preferida. Levamos um bolinho, duas velas, um sumo e fizemos uma festa. E foi mesmo bom! Não sobrou migalha do bolo e foi uma sessão de tutoria diferente.
A D. vai mudar de casa, o aumento dos impostos fez com que a renda da casa dela aumentasse e os pais trataram de procurar outra casa. A D. vai para uma escola na Maia e talvez não a volte a ver. Ainda assim, aprendi muito com ela. Aquela menina tem muito menos coisas boas do que eu algum dia terei e ainda assim nunca a vi triste ou a queixar-se. A D. foi um bocadinho mais feliz quando fez 13 anos e eu fico a torcer por muita sorte para ela. 


Tenho saudades de fazer voluntariado. Tantas que fui recuperar o texto que escrevi há mais de dois anos, sobre uma menina a quem dei tutoria. Um dia vou fazer voluntariado com idosos!
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